Um pouco mais de uma hora de conversa e claro, muitas, muitas risadas com esse talentosíssimo batera, que sempre bem-humorado contou detalhes da sua trajetória até aqui, hoje em dia, baterista da dupla Jorge & Mateus. Como gosto de dizer, mais um integrante do seleto grupo de músicos brasileiros que tem sua contribuição em hits que marcaram historia dentro do cenário musical.
Soundcheck: Quando a música surgiu na sua vida?
Biduca: Nasci no berço da música. Meu pai baterista, um irmão baixista, o outro guitarrista, minhas irmãs cantoras e toda a família, sempre na igreja.
Algo incrível e engraçado ao mesmo tempo, porque eu com os meus 5 anos e eles não me deixavam encostar nos instrumentos da igreja. Era encostar no instrumento que escutava: não mexa nisso, menino!
Então, esse sonho de tocar e de aprender, sempre esteve muito presente, desde moleque!
Soundcheck: Lembra como e quando foi a primeira vez que você tocou uma bateria?
Biduca: A primeira vez que eu toquei foi no dia que o baterista da igreja tinha faltado. Eu com meus 8 anos de idade, mais ou menos, e meu pai com cara de que eu não poderia fazer ele passar vergonha, me perguntou se eu queria tocar. (risos)
Aquela coisa… oportunidade com uma certa pressão psicológica. Mas fui lá, sentei na bateria e sai tocando. Lógico, os louvores todos muito simples, mas toquei e a partir daquele dia não parei mais. Esse é o lance da oportunidade que tanto falo.
Até hoje, sempre que aparece uma oportunidade estou ali para aproveitar!
Soundcheck: A família de músicos influenciou e ajudou nesse processo para chegar até aqui?
Biduca: Depois de ter mostrado para eles que eu realmente tinha talento, meu irmão, Giovani, um dos caras que mais me influenciou na música, começou a deixar eu pegar no baixo e assim fui crescendo no meio da música, tocando um pouco aqui, um pouco ali…
Hoje, só estou onde estou, claro, graças à Deus que me deu esse talento, mas devo muito a toda minha família, e ao meu irmão Giovani.
Soundcheck: Tiveram outras influências?
Biduca: Na minha época não tinha o acesso a tudo como temos hoje, ainda mais eu que venho de uma família humilde. Não tínhamos oportunidades, conhecimentos e muitos relacionamentos fora do nosso universo. Nossos ídolos eram as pessoas que tocavam na igreja.
Era uma emoção quando íamos como convidados em outra igreja e viamos outros músicos tocando.
Lembro de um dia quando meu primo me convidou para ir até a casa de um amigo que eu nem conhecia. Fomos lá – andamos muito – para ver um vídeo de uns caras tocando. Era uma fita do Dennis Chambers… aquilo mudou a minha concepção sobre o que era música e de muitas outras coisas na minha vida. Foi a primeira vez que eu assisti um baterista na televisão. (risos).
Naquele momento a minha cabeça tomou um outro rumo… algo realmente incrível.
Voltei com aqueles grooves na cabeça e tão chocados com aquilo tudo que tínhamos acabado de conhecer, que fomos direto para igreja ficar tocando.
Soundcheck: Quando foi sua estreia nos palcos fora da igreja?
Biduca: Depois desse momento que mudou a minha vida e a forma de enxergar a música, comecei a ir atrás de conhecimento e novos materiais.
Com isso, foi surgindo à vontade de tocar em outros lugares, fazer outros sons… mas minha mãe não deixava. Tocar para ela, era somente dentro da igreja e até mesmo me impedia de tocar música do mundo.
Até que um dia surgiu a oportunidade de tocar, tomei coragem e fui… mesmo sem ela saber e assim fui crescendo.
Comecei a tocar com um compositor de vários sucessos da Bahia, que estava montando uma banda para um projeto novo. Ele tinha bateria, estúdio e ainda uma van que pegava todo mundo em casa para levar para os ensaios.
Foi assim que comecei a adquirir uma experiência massa, tirar músicas de Pagode, Axé… conheci outros músicos, até que um dia pintou uma oportunidade de fazer um carnaval. (risos)
Fiquei pensando: logo um carnaval… minha mãe nunca vai deixar! Mas não poderia perder aquela oportunidade de tocar 5 dias e ganhar um cachê legal. Aceitei a proposta e disse para minha mãe que eu estava indo para um acampamento da igreja. (risos)
Essa experiência foi mais incrível ainda porque tiveram vários ensaios, repertório muito grande e tocamos cinco dias em um trio elétrico.
Na volta, claro, contei a verdade e ela ficou espantada: “como assim você foi tocar no carnaval?” Separei uma grana e dei na mão dela e ela disse: “meu filho, quando vai ter outro carnaval?” (risos)
Soundcheck: Até então, em Salvador – BA?
Biduca: Sim. Depois dessa experiência, vi que eu levava o jeito para a coisa e comecei a perceber que o meu tempo em Salvador tinha acabado.
Como meus irmãos estavam todos em São Paulo, comprei minha passagem e desse dia em diante a minha vida tomou outros rumos.
Soundcheck: Essa “baianidade” te ajudou de alguma forma?
Biduca: Ajudou sim, muito! Como todo mundo conhece, o Baiano tem um Swing diferenciado e crescendo naquele ambiente acabei absolvendo um pouco de tudo.
Mas você tocou em um assunto legal. Porque eu conheci o Rodriguinho – o artista que eu acompanhei durante um bom tempo – na igreja.
Toquei justamente no culto que ele estava e na segunda-feira ele me liga dizendo que me viu tocar no culto. Que tinha pego meu telefone com o Bal Furtado e disse que os Travessos estava passando por uma reformulação na banda e que estavam precisando de um batera com a minha pegada.
Foi na época que eles estavam começando a fazer um trabalho com uma pegada mais pop e essa oportunidade calhou muito bem, porque, já estava tocando muito essa onda gospel, algo que me ajudou adquirir o que eles estavam precisando com aquela mistura do swing da Bahia.
Soundcheck: Sua passagem pelos Travessos foi algo que marcou muito, porque?
Biduca: Quando aconteceu tudo isso eu entendi o porque Deus tinha me trazido até ali. Realmente era para agarrar com unhas e dentes e assumir a minha personalidade. Algo que ia soar diferente, mas que era exatamente o que eles precisavam para o novo som deles.
E realmente até hoje as pessoas lembram o que eu fiz nos Travessos. Simplesmente porque eu coloquei a minha personalidade, e só estava fazendo o meu som.
Foi um momento diferente, até então tocava mais nos projetos da igreja, e de repente pinta um projeto da forma que foi com eles e na sequencia com o Rodriguinho, com quem tive o prazer de tocar no Brasil todo praticamente, Estados Unidos, Europa… Foi intenso e um momento que abriu portas.
Soundcheck: Essas experiências e influências foram o necessário para abrir as portas para o universo das gravações?
Biduca: Nessa época, tocando muito e acabava não gravando tanto. Mas gravei o único DVD dos Travessos… que foi uma experiência incrível.
Mas o fato de ser um músico que sempre escutei de tudo, música americana, sertanejo, instrumental… e o Rodriguinho – como tinha mais acesso a essas coisas – sempre trazia novidades para gente ouvir. Tudo isso foi fundamental para meu crescimento musical e começar a chamar a atenção quando tinha a oportunidade de gravar.
Todo dia temos que estar aprendendo alguma coisa. Tem um versículo da Bíblia que eu amo.
“O povo perece por falta de conhecimento”
Você tem que estar aprendendo todos os dias, estar lendo, aprimorando, buscando coisas novas, novos sons… nós que trabalhamos na estrada não podemos ficar acomodados só porque já conhecemos o repertório de cor e salteado, tem um cachê legal… não se acomode por causa disso, vá estudar para não se tornar um músico piloto automático.
Soundcheck: Como foi entrar nesse universo da música sertaneja?
Biduca: O músico tem que estar aberto para todos os tipos de música, como te falei. E o sertanejo me chamava a atenção… bandas massa, uma galera tocando legal e fazendo música de qualidade.
Mas tem um cara que foi fundamental e o divisor de águas na minha vida. Meu grande amigo Dudu Borges, que também conheci na igreja, muito antes de tocar com os Travessos… bem no começo de tudo.
Um dia depois do culto chegou um cara em mim dizendo que era de Campo Grande – MS, e que estava produzindo algumas coisas e tal… depois me convidou para ir na casa dele onde também conheci uma outra pessoa incrível, o Ivan Miyazato, que dividia apartamento com ele.
O começo de tudo, mesmo! Ele, recém-chegado em São Paulo, começando a produzir algumas coisas aqui e ali. Até que um dia, já no estúdio 12, ele me ligou querendo que eu gravasse, no dia seguinte, uma música que ele dizia: “essa é a música da minha vida”.
No outro dia estava lá, cedinho com a batera afinada e com o som que ele queria. Assim gravei a primeira música sertaneja da minha vida “Sufoco” do João Bosco & Vinicius.
Quando eu ouvi os arranjos eu disse que ele era louco e lembro que ele disse: “por isso que estou dizendo que essa é a música da minha vida”. (risos)
Essa música foi a minha entrada no mercado da música sertaneja, e foi o divisor de aguas na vida dele e na minha também.
Depois disso comecei a gravar toda essa galera nova que estava surgindo, como: Janaynna Targino, Michel Telo, João Bosco & Vinícius, Jorge & Mateus… muita gente mesmo, todas as produções ele sempre me chamava para alguma coisa.
Soundcheck: Como é trabalhar com segmentos diferentes, produtores diferentes…?
Biduca: Quando o Rodriguinho saiu dos Travessos, o primeiro disco dele quem produziu foi o Prateado (Produtor Musical), o mesmo produtor que já produzia os Travessos, mas o Rodriguinho disse que teria que ser eu de batera e o Prateado disse que gravaria somente 4 musicas do disco… enfim.
Cheguei no estúdio, gravei a primeira, segunda… na quarta música o Prateado disse para fazer o disco todo. (risos)
Depois disso o Prateado, junto com o Rodrigo, me deram muitas oportunidades. Gravei todos os trabalhos solo do Rodrigo, e vários projetos do Dudu. Essas oportunidades me fizeram crescer e possibilitou com que eu firmasse no universo das gravações. Assim pude trabalhar em diversos projetos de vários segmentos… volto a frisar, estava no pagode mas nunca deixei de fazer outros sons.
Soundcheck: Versatilidade de instrumentos também conta mais um pouco?
Biduca: Sempre, desde muito tempo faço algumas coisas com o baixo. É que na época não tinha Instagram… então por isso o pessoal não sabia tanto. (risos)
Hoje, quando preciso tirar uma música nova, tiro ela toda no baixo… isso abriu muito a minha mente. Sempre digo: todo músico precisa tocar um segundo instrumento.
Soundcheck: Como foi começar a pegar estrada com Jorge & Mateus?
Biduca: Claro que o sertanejo é um mundo diferente e o momento que o sertanejo está vivendo é uma loucura… tocando no Brasil todo.
Nos festivais encontro estruturas absurdas que em outras segmentos e até mesmo no pagode não encontrava fácil. Essa entrada oficial no Sertanejo, vamos dizer assim, aconteceu sem que eu estivesse esperando.
Já não estava mais com o Rodriguinho e só estava tocando na igreja. Até que em um belo dia, em casa, o Dudu me liga convidando para gravar um DVD do Matheus & Kauan, dizendo que seria um trabalho muito legal – e que realmente foi – fizemos o DVD “Mundo Paralelo”.
Com isso comecei a receber convites, até mesmo do Matheus & Kauan, para fazer parte da banda, enfim… e quando chegou no fim do ano o empresário do Jorge e Matheus me liga, fazendo um convite para começar no inicio do ano seguinte como baterista deles, com isso acabei aceitando, comecei a “pegar estrada” com eles e me mudei para Goiânia.
Tudo está no tempo de Deus. Muitas vezes até fazemos os nossos planejamentos mas se não estiver no tempo Dele, não é para acontecer. Hoje estou aqui, muito feliz em acompanhar essa turma pelo Brasil todo.
Soundcheck: O que te fez chegar até aqui?
Biduca: Tudo isso que eu vivi até aqui, foi um um grande aprendizado, tanto é que a cada dia estou crescendo, evoluindo como pessoa, como pai, como marido, como músico… cada passo até aqui, sem dúvida, somou para ser o Biduca de hoje.
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Meu irmão, que moral a minha… foi um prazer te reencontrar, poder bater esse papo contigo, saber de detalhes da sua trajetória até aqui e acima de tudo, poder compartilhar aqui no Soundcheck para inspirar e motivar tantos outros músicos pelo Brasil. Um forte abraço e sucesso! Tmj
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