Um bate-papo que por pouco não vira a madrugada! Não só pelas grandes histórias, mas também, pela forma e alegria do Sandrão em contar e recordar cada uma delas com uma riquezas de detalhes que jamais conseguiremos transcrever em um único post!
Soundcheck: Quando surgiu o interesse pela música?
Sandro: Eu era pequeno e segundo os relatos dos meus pais, com uns 2 para 3 aninhos, eu já era muito ligado a música, tinha um pianinho e os meus brinquedos sempre foram musicais.
Venho de uma família que não tem músicos e uma das poucas memórias que eu tenho, é na casa do meu avô, interior de São Paulo. Vendo ele e meu pai batucando na mesa, comecei a batucar junto… me lembro da batida até hoje!
Soundcheck: Como foi seu primeiro contato com a bateria?
Sandro: Quando eu tinha uns 9, 10 anos meus pais gostavam de ir a bailes, eu era o caçula e não tinha como ficar sozinho em casa, então, tinha que ir junto!
E o que uma criança faz em um baile? Quando não estava correndo com as outras, ficava olhando a banda no palco, durante muito tempo e o que me chamava muito atenção, era o baterista. Ficava olhando ele tocar para depois imitar os movimentos.
Lá por uns 13 anos no colégio, tinha alguns amigos que já estavam musicalmente iniciados e eles começaram a me falar… isso que eu estava falando era o chimbal, o que toca com o pé é o bumbo, esse outro é a caixa… até então só via o batera tocando, não sabia nada!
Minha brincadeira na época era chegar em casa e tocar. Só que eu não tinha batera! (risos)
Tocava com colher nas almofadas que montava no chão… e lá ficava batucando!
Os meus pais contam que vendo esse meu movimento, que já estava infernal, pensando em música o dia inteiro, resolveram comprar uma bateria Gope usada que eu brincava dizendo que era uma Yamaha! Yamaha com isso, Yamaha com aquilo, Yamaha com arame… (risos)
Foi muito louco, por que quando eu subi em uma bateria pela primeira vez, com uns 14 para 15 anos, já fui tocando… lógico, tocando mal! Mas já fazia algumas coisas que o meu amigo Leandro Nogueira ia falando para tocar e assim ele foi me testando. Toca isso, toca aquilo…
Soundcheck: Quais foram suas primeiras influências?
Sandro: Minha formação foi muito legal, por causa dessa época e por causa do Leandro, comecei a escutar muita coisa boa, ainda guri.
Acabei caído em uma turma dos formadores de opinião da escola, uma galera rock’n’roll, os caras me jogavam varias fitas K7, querendo me testar também. Comecei a ouvir John Bonham, Beatles e as bandas da moda que eram Guns N’ Roses, Faith No More e Nirvana sons que eu pirei e comecei a ficar influenciado!
A diversão da minha infância inteira era rádio, escutando muitas coisas… gravando e ficando puto por que aparecia umas propagandas no meio das músicas e eu perdia a gravação! (risos)
Minha irmã ouvia muita coisa boa, vinha de São Paulo com todas as novidades e com isso comecei escutar Gilberto Gil, João Gilberto, Elis Regina, Tom Jobim…
Eu ficava tocando batera junto com esses discos, passava o dia inteiro tocando por curtição, saca? Hoje vejo que isso é um puta estudo… bom pra caramba!
Isso tudo, acabou aflorando uma musicalidade que fui descobrindo por si só, não foi nada forçado.
Soundcheck: Quando foi que a música deixou de ser somente uma diversão?
Sandro: Com uns 16 anos, um amigo da minha irmã, o Odon Nakazato (Estúdio Vozes), foi em um churrasco na minha casa. Ele começou a tocar violão e comecei a acompanhar com uma timba, ficamos horas tocando.
Uma semana depois ele liga em casa me convidando para tocar no Rádio Clube às quintas feiras… eu pensei mil vezes em desistir mas acabei aceitando. Mesmo com muito medo fui lá fazer timba junto com ele, o Mestre Assis (saxofonista) e a Melissa Azevedo (cantora).
Quando acabou a noite, recebi meu primeiro cachê e nesse período fui adentrando no mundo da música e comecei a entender como são as coisas, conhecer outros músicos até que fui pegando gosto!
Eu era tão novo que o Odon me buscava e me levava em casa toda quinta feira… Assim foi até meus 18 anos!
Soundcheck: Você começou tocando timba mas de destacou como baterista, como foi isso?
Sandro: Precisamos sempre estar aberto… Quando ainda estava tocando no Rádio, mudou para Campo Grande o Tuba (guitarrista), tinha recém tocado com a Marisa Monte, muito amigo do Tadeu Patola (produtor), chegou aqui com outra visão e começou implantar na minha cabeça que eu precisava começar tocar bateria.
Eu até já tocava bateria, mas só em casa… bateria era minha diversão e a timba era o instrumento que eu usava na noite!
Conhecendo um pouco mais de música, já escutando algumas coisas instrumentais, comecei a ver que esse universo eu só teria com a bateria e com isso comecei a me dedicar só a ela. Foi quando fiz um sub para o Fernando “Bola” (baterista), no Américo e Nando.
Soundcheck: A noite te trouxe muitos conhecimentos e contatos, quem são essas pessoas
Sandro: O Cristiano Kotlinski foi muito importante para mim e para todos os músicos da minha geração. Ele foi o cara que pegou a gurizada que estava chegando na noite e disse que estava legal, mas não era só isso. Para ser músico de verdade tinha que estudar e muito!
O Cristiano construiu essa mentalidade na minha geração, mostrou como tem que ser sério!
Apresentou sons como do Chick Corea, Dave Weckl, Dennis Chambers… que abriu minha consciência para esse novo mundo que era muito distante.
Com uns 17 anos outro super incentivador foi o Jerry Espíndola meu parceiro até hoje, que não tenho palavras… Um certo dia ele tocou a campainha de casa dizendo que ficou sabendo que eu tocava bateria e percussão. Me convidou para tocar em um projeto com ele. Eu aceitei, claro!
Esse equilíbrio, o Cristiano me incentivando para o mundo instrumental, de tirar o máximo do instrumento e ao mesmo tempo o Jerry com o lado mais profissional, dizendo que é preciso tocar, tocar o que é bonito sem ficar fazendo firulagem … foi muito importante, saber balancear.
A partir desse momento, tocando com o Jerry, comecei a conviver com uma galera barra pesada da música, como: Wlajones Carvalho “Pacote” (baterista), Luis Marcelo (baterista), Alex Mesquita (baixista), Marcelo Ribeiro (baixista), Adriano Oliver “Magoo” (tecladista)… estudava muito com essa galera, ouvia muita coisa boa!
Fui também conhecendo o restante da família Espíndola, onde comecei a tocar com todos eles, Alzira Espíndola, Tete Espíndola, Dani Black, Celito Espíndola, Geraldo Espíndola e Gilson Espíndola… e também todos esses ícones da música sul-mato-grossense, como: Geraldo Roca, Paulo Simões, Guilherme Rondon, Almir Sater… sonhava em tocar com esses caras e quando vi, já tinha tocado com todos eles!
O Antonio Porto (multi-instrumentista), também teve um papel muito importante na minha formação, chegou da Áustria, trazendo uma música contemporânea absurda, muito word music, África na veia! Sabia tudo de música africana e o que estava rolando na Europa. Esse cara me deu outra visão e muita criatividade musical… trouxe um pouco de caos para a gurizada da minha geração!
Soundcheck: Como aconteceu Jerry & Croa e a polca rock?
Sandro: Foi um momento de muita pesquisa da música da nossa região e de toda a bacia do Prata. Música essa, com influências ternaria, poli rítmica que é difícil de tocar e entender sua divisão, mas que é natural para quem nasce aqui.
Com isso, entramos nesse patamar de muita pesquisa e criação, nos apresentamos em lugares importantes. Tudo devido estarmos fazendo “a contramão”. Sair do mundo comercial possibilitou tocar nos SESC’s, Itaú Cultural… do eixo Rio-São Paulo.
Quando você faz isso, buscando qualidade, abre um mercado que é a coisa mais linda!
Soundcheck: Como foi que conseguiu o reconhecimento dentro dos estúdios?
Sandro: Toda essa galera dos estúdios… todos esses produtores foram muito importantes na minha vida. Venho aprendendo com todos eles, desde a época dos guris da MIT Records, Michel Teló, Ivan Miyazato e Teofilo Teló, também com o Alex Cavalheri “Fralda”, e depois quando cheguei no Rio conheci o Anderson Rocha que me chamou para gravar com muita gente legal por lá.
Estúdio é uma coisa que eu amo, amo gravar tanto quanto tocar.
Soundcheck: Como aconteceu de ir tocar com o Zé Ramalho?
Sandro: Era época da internet discada… tudo mais difícil, a informação não chegava como hoje. Tinha que assinar as revistas para ficar ligado no que estava acontecendo no mundo da música. Com as propagandas conheci o Festival Batuka e os workshops com bateristas do mundo todo que Vera Figueiredo (baterista) trazia. Mesmo morando em Campo Grande eu sempre dava um jeito de fazer os workshops e as aulas com esses grandes bateras… fiz muitos!
Nesse período comecei a me dedicar muito para o festival, tanto foi que ganhei o Batuka em 2001! Saiu muitas matérias nas revistas da época e nisso o Chico Guedes diretor da banda do Zé Ramalho, que já tinha passado algumas vezes por Campo Grande e conhecia o nosso som, me viu em uma dessas revistas. O Zé estava reformulando a banda, e o Chico comentou com ele sobre o meu resultado no festival, com isso surgiu o convite para fazer um show/teste na cidade de Londrina. Tudo sem ensaio, somente com o repertório em uma fita K7. Passei no teste e por lá, fiquei cinco anos… foi uma experiência muito legal!
Mudou minha vida, além de ir morar no Rio de Janeiro tive a experiência de rodar um Brasil que você não roda se não for a trabalho. Um dia estava em Cascavel/PR, no outro Bento Gonçalves/RS e no outro já estava em Manaus/AM, era assim! Foi um aprendizado poder conhecer o Brasil de verdade e o povo brasileiro.
Foram cinco anos intensos, de muitas gravações e muitos shows. O Zé Ramalho tem dessas coisas, gosta de dar muita chance para quem esta com ele. É sempre a banda que grava os discos, que grava o DVD… Nós fazíamos de tudo!
Soundcheck: Você tocou o Brasil todo mas também já andou por outros países, como foi isso?
Sandro: Logo que sai do Zé Ramalho, recebi um convite para participar do projeto Babeleyes da Tete Espíndola junto com o Philippe Kadosh, onde fiquei um bom tempo em Paris e conheci muitos outros países da Europa, foi um aprendizado bastante especial.
Depois dessa experiência na França, decidi tocar somente sons que me satisfaça. Já tinha experimentado muitas coisas, mas foi lá que experimentei esse tipo de música que tocou de mais em mim. Algo muito sofisticado e foi ali que comecei a perceber que isso era o que eu queria, independente se daria dinheiro ou não.
Eu preciso dessas duas coisas, fazer um som que me satisfaça com pessoas que eu admiro.
Soundcheck: Mesmo com todos os compromissos, você sempre esteve com o Dani Black e continua com ele até hoje, por quê?
Sandro: Começou bem lá atrás! A Tetê veio fazer um show em Campo Grande e chamou a “banda do Toninho” (Eu, Wlajones, Marcelinho, Magoo e o Toninho) para acompanha-la.
Durante o show, tivemos a participação do Dani Black (filho da Tetê), para cantar uma música de sua autoria. Nesse primeiro contato com o Dani, ficamos impressionado com aquilo, como poderia uma criança de 11 anos cantar, tocar e compor tão bem!
E essa historia não acabou mais, depois fomos acompanhar o Dani em um festival que ele também arrasou. Na sequência foi para a França, na época do Babeleyes, onde fez uma participação que arrasou outra vez.
Então a minha história com o Dani vem desde sempre e continuo tocando com ele até hoje!
Soundcheck: Atualmente quais são os seus projetos e planos?
Sandro: Esses últimos anos 2014 e 2015, foram muito importantes para minha carreira. Tudo começa com a ideia de montar algum trabalho onde eu fosse um dos protagonistas, resolvemos montar o Urbem junto com meus amigos Gabriel Basso (baixista), Bianca Bacha (vocais e ukulelê) e Gabriel Andrade (guitarrita). Começamos a nos dedicar muito e curtir a vibe… eu não gosto nem de chamar de ensaios e sim um encontro de amigos que um admira o som do outro, acredito que por isso conseguimos coisas que nem esperávamos.
Nos inscrevemos por acaso no maior festival de música instrumental do Brasil Samsung E-Festival e quando vimos fomos selecionados pelo Ruriá Duprat (maestro e produtor), entre os 10 melhores. Isso já foi o máximo!! Entramos para votação popular e lá recebemos a maior votação da história do festival.
Depois começou a acontecer muitas coisas!! Tudo muito rápido, fizemos uma tour com o Yamandu Costa e depois uma com o Wagner Tiso, onde tocamos muitas músicas do repertório do Clube da Esquina… foram momentos especiais!
Fomos para WOMEX – The World Music Expo, uma das maiores feiras de business, que esse ano aconteceu em Budapeste na Hungria… lá tivemos um feedback muito positivo sobre nossa música.
Mesmo indo de curiosos, conseguimos vários convites, que ainda estão em trâmites para tocar em grandes festivais da Europa e Ásia.
Agora o Ruriá Duprat, esta vindo a Campo Grande para produzir uma música nossa. Vamos passar um dia inteiro no estúdio do Fralda gravando com o cara que já produziu a Diana Krall… vai ser muito bom!
E não para por aí… semana passada fomos abrir o workshop do Tony Royster JR que rolo em Campo Grande, algo que eu nunca imaginei!
A última grande surpresa que aconteceu comigo, foi o convite do Carlos Campi produtor do Jorge Drexler, para tocar em um show da turnê mundial “Perfume”, que aconteceu em novembro na cidade de São Paulo… foi um dos melhores shows da minha vida!
Sandrão, agradecemos em poder contar um pouco da sua história e esperamos ter conseguido transcrever com a mesma riqueza de detalhes que foi nosso bate-papo.
Estamos a disposição para acompanhar de perto os seus atuais e futuros projetos… Valeu!
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