Confira como foi o bate-papo como Antonio Porto, o cara citado como referência por grandes nomes da música brasileira.
Soundcheck: Quem é Antonio Porto?
Antonio Porto: Um cara extremamente inquieto, ansioso e que se preocupa com a generosidade.
Quando deparo com alguma atitude minha não generosa, me incomodo muito. Procuro traçar o caminho da generosidade, para mim, é a coisa mais importante para a convivência social, profissional… sem generosidade não existe nada.
Se eu significo alguma coisa para alguém no mundo da música, foi por estar sempre atento a generosidade!
Generosidade é a palavra magica, é o que influência meu som.
Soundcheck: Com qual instrumento começou?
Antonio Porto: Comecei com as panelas na casa da minha mãe! (risos)
Gosto de tudo, o ritmo é algo que está muito forte na minha música e nas minhas composições, isso todo mundo vê. Já me chamaram até de percussionista das cordas ou qualquer coisa assim… não sei o que é! Sempre tive uma noção rítmica muito boa, desde criança, sabia onde estava o tempo… certinho.
Ainda na infância, veio o violão que era um instrumento muito normal na minha casa e que todos tocavam. Começou tudo muito natural, meu pai passava e me ensinava alguma coisa, meu irmão passava e me ensinava outra coisa. Não tive aquela coisa de aulas… e acho que se tivesse isso, não estaria tocando hoje! (risos)
Na verdade, gostava mesmo de jogar bola, passava o dia todo jogando e a música era a busca por um outro universo do qual eu pudesse dividir um pouco meu tempo.
A música aos poucos foi tomando conta e na hora que eu vi, não tinha mais volta.
Soundcheck: Qual é a sua intenção quando você está no palco?
Antonio Porto: Na verdade quando estou tocando, eu quero que as pessoas sintam o que eu estou sentindo, procuro transmitir isso.
A minha intenção é sempre essa, eu não quero me sentir sozinho, aquele momento não é só meu. Estou servindo de instrumento da ação da natureza, para que as pessoas tenham um momento feliz, agradável e de muita emoção. Passo isso em todas as formas, cantando, tocando, com expressão corporal…
Soundcheck: Você se intitula um multi-instrumentista?
Antonio Porto: Então cara… sou muito curioso e tenho facilidade em tirar sons. Pegar o instrumento, ver o corpo dele, anatomia e imaginar como aquilo pode soar. E quando vejo, estou tirando um som. Mas chegar a tocar o instrumento vai do tempo que você se dedica a ele depois.
Eu nunca fui muito preocupado com isso… só quero tocar!
Logicamente que no decorrer da vida algumas pessoas vão te chamando para você ser baixista, violonista, percussionista… até pianista já me chamaram!
O instrumento é apenas um meio… um instrumento!
Eu não penso em nada disso, para mim tanto faz qual o instrumento vou tocar eu penso na música. Não tenho uma classificação!
Soundcheck: Você se dedicou muito aos estudos?
Antonio Porto: Teve um período que estudei em Viena, para ter uma carta na manga e não por achar que dependia daquilo. Música para mim, é outra coisa!
Eu sempre encarei essas coisas de estudar por querer entender a ciência e não a essência!
Você pode transmitir muitas coisas para as pessoas através da música, sem todas essas informações científicas.
Pode ver no YouTube. O africano tocando violão com uma corda só. Cara.. aquilo ali é maravilhoso! Agora eu te pergunto, será que ele estudou para fazer aquilo? Não, é natural, ele pegou o instrumento e saiu tocando!
Lógico que depende muito onde você quer chegar. Se quer ser virtuoso, então você perde sua vida para viver a vida do seu instrumento. Pode ser que você se torne o cara mais virtuoso do mundo e quando você olha para o lado, percebe que tem milhões de virtuosos iguais a você! O que adiantou tudo isso?
Enquanto isso o cara que ficou lá, nunca abriu um livro de música, se quer praticou alguma coisa em casa e quando pega o instrumento o mundo inteiro se ajoelha perante ao cara. E você vai falar que o cara não é musico!?
Música é isso, não existe uma regra.
Mil notas tocadas não refletem o que duas notas tocam!
Soundcheck: Grandes nomes da música já citaram você como referência, o que isso representa?
Antonio Porto: Acredito que, a minha liberdade musical é o que mais atinge todas essas pessoas.
Eu escolhi ser músico para ser livre, livre mesmo… em todos os aspectos!
Para mim não existem notas musicais, existem sons!
As notas são apenas uma referência, ciência, que não tem nada a ver com a música!
Quando voltei da Europa, toquei com todos esses caras, Sandro Moreno (baterista), Adriano “Magoo” (tecladista), Wlajones “Pacote” (baterista), Marcelo Ribeiro (baixista), Alex Mesquita (baixista)… Uma turma de músicos maravilhosos. Eu não formei ninguém, não ensinei ninguém a tocar, apenas apresentei para eles a liberdade musical. Acredito que foi isso que fez todos esses músicos se encantarem comigo.
Todo show com essa galera, era uma verdadeira experiência musical.
Liberdade é a coisa que o ser humano mais gosta. E quando você leva liberdade para as pessoas, você ganha muitas coisas em troca, como: amigos, fãs, seguidores…
Soundcheck: E quem foram suas referências?
Antonio Porto: A minha base musical nasceu na “Tropicália”, foi o disco que mais ouvi na minha infância!
Tenho Gilberto Gil como escola e Milton Nascimento como minha religião, crença, emoção… esses dois tem um papel fundamental na minha música! Sem esses caras, eu não seria quem eu sou, são grandes inspirações.
Logo depois vem o Joe Zawinul – Weather Report, com a textura sonora que eu queria. O Youssou N’Dour com a percussão e o Egberto Gismonti com a experimentação, espiritualidade… que teve uma parcela muito importante para mim como instrumentista.
Aí vem o Alegre Corrêa, que conheci na Áustria, fazendo o encontro disso tudo, ele teve esse papel importantíssimo trazendo a liberdade que eu procurava.
Por último, mas não menos importantes, todos meus amigos e parceiros musicas aqui de Campo Grande, como toda a Família Espíndola, Rodrigo Teixeira, Paulo Simões… e sou quem eu sou por causa dos meninos: Alex Mesquita, Sandro Moreno, Marcelo Ribeiro, Wlajones, Adriano Magoo… Todas as influências que eu trago, acontecem por causa desses caras. Que foram peças chave para que eu conseguisse transmitir isso tudo!
Soundcheck: Você escolheu Viena ou ela te escolheu?
Antonio Porto: Tenho uma relação muito forte com Viena, desde a primeira vez que eu escutei Mozart, que apesar de não ter nascido em Viena, construiu praticamente toda sua obra lá, Beethoven e Arnold Schönberg também. Isso faz Viena ser muito fascinante para mim.
Acabei morando ao lado da casa do Beethoven durante alguns anos… foi fantástico!
A fase que eu vivi em Viena, foi de muita produção, estava o dia todo produzindo alguma coisa. Era uma vivência musical muito intensa e constante.
Conheci músicos maravilhosos, como o Alegre Corrêa, Pedro Tagliani, Elias Meiri, Hubert Von Goisern… parceiros musicais que tiveram um papel importante na minha carreira.
Me encontrei, vivendo todo esse tempo em Viena. Foi a cidade que me acolheu e me ensinou tudo.
Soundcheck: Como chegou a outros países da Europa?
Antonio Porto: Como a Áustria é um pais muito pequeno, o mercado se expande para fora. Toquei praticamente na Europa inteira, todos os países da Europa Ocidental e do lado Oriental conheci vários.
É muito normal que os músicos viagem para tocar em outros países.
Soundcheck: Qual a influência da África na sua música?
Antonio Porto: Desde criança, comecei a perceber que todos os “fodões” que conhecia eram negros… Pelé, Gilberto Gil, Milton Nascimento, Luiz Melodia, Bob Marley… meus maiores ídolos, são negros!
Esse é o meu povo, é desses caras que eu quero alguma coisa!
Quando cheguei na Europa, onde você tem muito contato com os africanos, me aguçou querer saber de onde vinha essa essência toda dos caras. E me fez estar em contato direto com os africanos. Eu gostava tanto da música deles, que acabava assimilando tudo muito fácil e teve uma época que virei o baixista deles em Viena.
Na sequência veio a explosão da música africana na Europa com o Salif Keïta, Youssou N’Dour, Papa Wemba… aí eu pirei! Foi uma coisa maravilhosa ter descoberto esses caras!
A minha música é uma mistura disso tudo com a música brasileira, é onde eu quero chegar!
Soundcheck: Como é seu processo de composição?
Antonio Porto: Eu tenho dificuldade em escrever retórica, geralmente as coisas que eu escrevo são verdadeiras, coisas que realmente sinto.
Quando eu falo, é o que eu sinto, vivo ou vejo.
Do Paulo Simões eu tenho a métrica poética, procuro me inspirar na forma que ele escreve, como usa as rimas, os verbos, como constrói as frases verbais… Para mim ele é um dos maiores poetas desse país. Uma grande inspiração, quando vou escrever uma letra, penso nele!
O Alexandre Lemos, outro parceiro, é um cara que eu admiro demais. Quando eu preciso alguma coisa que seja retórica na minha música, para completar uma frase ou qualquer outra coisa, me inspiro muito nele… é um cara que eu acho que faz muito bem isso.
Me inspira muito a forma como esses caras escrevem!
Soundcheck: Por que Nômade?
Antonio Porto: Eu sou um aquariano, meio que já nasci assim!
Lá no início, quando comecei a fazer música… ninguém podou minhas asas, na minha casa sempre fui muito respeitado.
Essa coisa da liberdade com minha inquietude, fez com que eu realmente me tornasse um nômade, não só geográfico, mas de um monte de outras coisas. Gosto de conhecer, assimilar e compreender culturas. Costumo transitar bem por todas elas.
Soundcheck: A música “Nômade”, é uma autobiografia?
Antonio Porto: Foi uma coisa muito louca!
O Paulo Simões me deu um caderno de anotações, com um monte de coisas que ele tinha escrito e um poema enorme, de onde tirei várias frases e fiz a letra.
A letra é do Paulo Simões, eu apenas ajustei ela. As frases são todas dele, a não ser, “sem o espiritual não há nada em que eu me apegue”, que é a única frase minha.
O “Nômade” foi isso, um poema do Paulo que eu me identifiquei na hora. Me vi ali e misturei as frases da maneira que achava melhor. Montei a letra da música dentro da poesia do Paulo Simões. (risos)
Soundcheck: No último show em Campo Grande, você apresentou uma música inédita, está preparando um disco novo?
Antonio Porto: Eu vou fazer para registrar, mas não tenho a menor pressa. Sou completamente desapegado a disco. Acho que disco não presta para a música e sim para o mercado.
Eu prefiro mil vezes tocar, fazer show e quem quiser gravar, grava, filma… como te falei, para mim, música é liberdade!
Foto – Sonia Mibielli
Toninho, agradecemos demais pelo bate-papo e esperamos colocar em prática as ideias que surgiram nesses últimos dias que passamos juntos. Vlw!
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